quarta-feira, 17 de junho de 2009

Praticando o desapego



A entrega do Oscar de melhor filme estrangeiro neste ano trouxe uma surpresa. O filme japonês A Partida (Departures /Okuribito) levou a tão desejada estatueta no lugar de outros filmes mais incensados pela crítica. Mas afinal de contas, o que "A Partida" tem que o torna tão especial? Trata-se da história de um homem na faixa dos 20 anos, casado, que toca violoncelo numa orquestra em Tóquio, e esta é dissolvida pelo patrocinador. Ele volta à sua cidade natal com a sua mulher e consegue um emprego no qual ganha muito bem. O que o desagrada é o novo trabalho em si: arrumar defuntos para serem cremados, numa cerimônia em que a família da pessoa morta está presente. À medida em que ele persiste no emprego, começa a perceber a importância do que faz e a dignidade de honrar os mortos em sua despedida.

A morte faz parte da vida, mas muitas vezes a negamos, talvez pelo medo, talvez por estarmos ocupados demais tentando sobreviver. Quando entendemos a morte como a outra face da vida, esta toma um novo sentido. Podemos efetivamente viver – e não somente sobreviver. Geralmente a morte, principalmente de pessoas queridas, nos sacode de nossa zona de conforto, de uma forma mais ou menos intensa, provocando questionamentos sobre a vida, principalmente sobre aquelas questões que adiamos a resolução. A morte nos lembra que tudo passa, que nada é para sempre, e dá uma noção real de que o tempo anda, e não espera.

É preciso saber dizer adeus a quem nos deixa, mesmo sabendo que o que está presente naquele instante é um corpo sem vida. Isso realça a dignidade da vida, não só daquele que morreu, mas de quem ainda vive.

Dizer que a morte faz parte da vida nos faz pensar só no final, mas é muito mais presente do que isso: a cada situação em que precisamos terminar algo para começar uma nova etapa da vida, a morte está ali.

Pode parecer absurdo o que eu vou dizer, mas integre a morte em sua vida para que você possa viver mais plenamente. Busque soluções para aqueles problemas que vem adiando, como se o tempo não passasse. Perceba o que já terminou em sua vida, e você não reconhece. Muitas vezes nos apegamos a situações que já não fazem mais sentido, somente pela rotina. Podem ser situações de trabalho, de relacionamento, de hábitos. Viver tendo presente a perspectiva de que morreremos não deveria trazer medo, mas acentuar a responsabilidade que temos de fazer com que a nossa vida tenha o rumo que planejamos para ela. Assim, podemos ser dignos de um dia morrer conscientes de que buscamos (mas nem sempre conseguimos) realizar aquilo que é necessário da melhor forma possível.

2 comentários:

Anônimo disse...

Michel,
Levarei esse artigo super lúcido para o Multiply também, pois é meu tema prioritário de agora.
Nem consigo dormir mais à noite; conviver com uma morte tão próxima de minha mãe, tem me feito sofrer um bocado. Por mais que me prepare, por mais que saiba, é complicado.
Ás 6 da manhã, diariamente; entro em seu quarto com o coração na boca.
Final de abril, início de maio, imaginei que se fôsse.
Recuperou-se, mas continuamos "mortos-vivos" na rotina.
Muito obrigado pela postagem.
Manoel

Simone D. Rasche disse...

A morte como um estagio e o melhor aprendizado que recebi da minha mae e sua constante evoluçao espiritual. Podemos, se quisermos, exercer nossa fe, esperança, amor pela vida. Concordo plenamente que assim poderemos VIVER e nao apenas sobreviver.
Obrigada!!!