domingo, 6 de abril de 2008

CARTA DO CHEFE SEATTLE (1787-1866)


Carta do chefe Seatle, da tribo dos Duwamish, ao "grande pai branco" (o presidente americano Franklin Pierce) em resposta à sua proposta de comprar as terras indígenas dessa tribo com a promessa de formação de uma reserva, fato acontecido em 1854. Veja abaixo: Como se pode vender ou comprar o céu, o calor da terra? Não concebemos esta idéia. Se não possuímos o frescor do ar e a limpidez brilhante da água, como é possível comprá-los? Cada um dos pontos desta terra é sagrado par ao meu povo. Cada aresta brilhante de um pinheiro, toda a praia arenosa, cada névoa nos bosques ao escurecer, cada clareira e inseto a zumbir são santificados na memória e experiência de meu povo. O córrego que procura seu caminho entre as árvores carrega consigo as memórias do homem vermelho. Os mortos do homem branco esquecem a região de seu nascimento quando vão caminhar entre as estrelas. Nossos mortos nunca esquecem esta bela terra, pois ela é mãe do homem vermelho. Somos parte da terra e ela faz parte de nós. As flores que exalam perfumes são nossas irmãs; os cervos, os cavalos, a grande águia, eis nossos irmãos. Os topos rochosos, os sulcos nos vales, o calor do corpo do cavalo, o homem - todos pertencem à mesma família. Portanto, quando o grande chefe em Washington manda dizer que deseja comprar nossas terras, pede demasiado. O Grande Chefe diz que nos reservará um lugar onde possamos viver confortavelmente. Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos. Mas isso não será fácil. Pois essa terra é sagrada para nós. Esta água límpida correndo sinuosamente pelos regatos e rios não é simplesmente água, mas, sangue de nossos antepassados. Se vendermos a terra ao homem branco, ele deve lembrar-se que ela é sagrada. Deverá ensinar às suas crianças que ela é sagrada e que cada reflexo fantasmagórico na água pura do lago fala dos acontecimentos e memórias da vida de meu povo. O murmurar da água é a voz de meu pai. Os rios são nossos irmãos, mitigam nossa sede. Os rios transportam nossas canoas e alimentam nossas crianças. Se vendermos nossa terra ao homem branco este deve lembrar-se de ensinar aos seus filhos que os rios são nossos irmãos, como seus. E o homem branco deverá proporcionar aos rios a bondade que estenderia a qualquer irmão.

Sabemos que o homem branco não compreende nosso modo de ser. Uma porção de terra para ele, representa o mesmo que a próxima, pois é um forasteiro que vem à noite e extrai da terra aquilo que necessita. A terra não é sua irmã, mas, sua inimiga e quando ele a conquista prossegue a caminhar. Deixa a sepultura de seus pais após si, e não se incomoda. Rapta da terra aquilo que seria de seus filhos e não pensa duas vezes. A sepultura de sues e os direitos adquiridos de seus filhos são esquecidos. Trata sua mãe, a terra, e seu irmão, o céu como coisas que possam ser compradas, saqueadas, vendidas como carneiros ou colares coloridos. Seu apetite terminará por devorar a terra, deixando somente um deserto. Eu não sei. Nossos costumes são diferentes dos vossos. A visão de vossas cidades é dolorosa para os olhos do homem vermelho. Mas talvez seja pelo fato de que o homem vermelho é um selvagem e não compreenda. Não há um canto silencioso nas cidades do homem branco. Nenhum lugar onde se possa ouvir o desabrochar de folhas na primavera, ou o harmonioso bater de asas de um inseto. Mas talvez seja pelo fato de eu ser um selvagem e não compreender. O ruído somente parece um insulto aos ouvidos. E o que resta da vida se um homem não puder ouvir o grito solitário do pássaro ou o debate de sapos ao redor de uma lagoa, à noite? Eu sou um homem vermelho e não compreendo. O índio prefere o suave murmúrio do vento correndo sobre a face do lago e o aroma do próprio vento, limpo por uma chuva de meio-dia ou perfumado pelos pinheiros. O Ar é precioso para o homem vermelho, pois todas a s coisas compartilham do mesmo sopro - o animal, a árvore, o homem, todos compartilham do mesmo sopro. Parece que o homem branco não presta atenção ao ar que respira. Como um homem em agonia há vários dias,é insensível ao mau cheiro. Mas se vendermos nossa terra ao homem branco, ele deve lembrar-se que o ar nos é precioso, que o ar impregna com seu espírito todo ser vivente que apóia. O vento que deu a nosso avô seu primeiro inspirar, também recebe seu último expirar. E se vendermos nossa terra ao homem branco ele deve mantê-la intacta e sagrada, como um local onde até mesmo o homem branco possa ir saborear o vento, açucarado pelas flores dos prados. Portanto, iremos meditar sobre vossa oferta de comprar as nossas terras. Se decidirmos aceitar, imporei uma condição: o homem branco deve tratar os animais dessa terra como seus irmãos. Sou um selvagem e não compreendo qualquer outra forma de agir.

Vi um milhar de búfalos apodrecerem na planície abandonados pelo homem branco que os alvejou de um trem em movimento. Eu sou um selvagem e não compreendo como é que o fumegante cavalo de ferro possa ser mais importante que o búfalo que sacrificamos somente para que possamos permanecer vivos. O que o homem é sem animais? Se todos os animais se fossem, o homem morreria de uma grande solidão do espírito. Pois o que quer que seja que ocorra com os animais, breve acontece com o homem. Há uma grande ligação em tudo. O homem branco deve ensinar às suas crianças que o solo a seus pés é a cinza de nossos avós. Para que respeitem a terra, digam a vossos filhos que a terra foi enriquecida com as vidas de nosso povo. Ensinem as vossas crianças quilo que ensinamos às nossas, que a terra é nossa mãe. Tudo aquilo que acontecer à terra, acontecerá aos filhos da terra. Se os homens cospem no solo, estão cuspindo em si mesmos. Isto sabemos, que a terra não pertence ao homem, o homem pertence à terra. Isto sabemos: todas as coisas estão ligadas como o sangue une uma família. Há uma ligação em tudo. O que ocorrer com a terra, recairá sobre os filhos da terra. O homem não tramou o tecido da vida; ele é simplesmente um de seus fios. O que quer que faça ao tecido, faz a si mesmo. Mesmo o homem branco, cujo Deus caminha e fala com ele de amigo para amigo, não pode estar isento do destino comum. É possível que sejamos todos irmãos, afinal. Veremos. Uma coisa sabemos, que o homem branco poderá vir descobrir um dia - nosso Deus é o mesmo Deus. O homem branco poderá pensar que possui, como deseja possuir nossa terra; mas não é possível. Ele é o Deus do homem, e Sua compaixão é igual para o homem vermelho e para o homem branco. A terra Lhe é preciosa. Ofender a terra é desprezar seu criador. Os brancos também passarão; talvez mais cedo que todas as outras tribos. Contaminai vossas camas e uma noite sereis sufocados pelos próprios dejetos. Mas quando de vossa desaparição vós brilhareis intensamente iluminados pela força do Deus que vos trouxe a esta terra e por alguma razão especial vos deu o domínio sobre a terra e sobre o homem vermelho. Tal destino é um mistério para nós, pois não compreendemos quando todos os búfalos são exterminados, os cavalos bravios são todos domados, os recantos secretos da floresta impregnados pelo cheiro de muitos homens e a vista dos fecundos morros obstruídos por fios que falam.

Onde está o arvoredo? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu. É o final da vida e o início da sobrevivência.

(...). Seu apetite devorará a terra, deixando somente um deserto."

Extraído de The Irish Press.

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